Charles Bezerra Cabral
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Dando sequência a Literatura Cordelista, publicamos mais um exemplar do primo poeta Rena Bezerra.
O MILHO PLANTADO EM 15
SÓ NASCEU NO 16.
1
“O velho” Bernardo me contou
Que em 1915 não choveu
Uma semente por aqui sequer nasceu
Nem mesmo uma que seu primo lhe arrumou.
Era um milho do agreste que chegou
Trazido pelo bom Napoleão
Que queria implantar nesse sertão
Uma nova cultura resistente,
Pois trazia uma espécie de semente
Que enfrentava tempestade e sequidão.
2
Napoleão filho de ‘Mané’ Praieiro
Pros parentes e aderentes trouxe um fardo
Mas o grosso ele deixou com Bernardo
Pois sabia do vigor desse roceiro.
No preparo do roçado foi ligeiro
Mas o tempo parecia indiferente
Mesmo assim foi plantada a semente
Palmo a palmo sem falhar nem uma cova,
E tudo foi na fase da lua nova
Que é sinal de um inverno diferente.
3
Bernardo esperou pelo inverno
Mas um pingo de água não caía
A tristeza aumentava a cada dia
Trazendo-lhe um semblante nada terno.
O milho tão falado e tão moderno
Já na terra esperava uma neblina
Nem que fosse uma chuva mesmo fina
Para assim se fazer a gravidez,
O tempo vai passando de uma vez
E a semente fica ali, mas não germina.
4
Em 1915 assim se fez
Uma seca inclemente e devastante
Só se via os bandos de retirante
Abandonando o sertão por uma vez.
Mas Bernardo esperou por 16
E o ano já entrou com outra cara
De repente muita chuva aqui dispara
Todo dia, toda hora sem parar,
O sertão veio enfim se alegrar
E o roceiro para a planta se prepara.
5
Todo mundo dessa nossa região
Que estava esperando pela chuva
Viu a própria se encaixar como uma luva
Que protege toda a palma da mão.
E assim foi embora a sequidão
O sertão teve alívio nessa hora
O caboclo muito alegre sem demora
Bota um riso estampado em sua cara,
Pega um facho bota fogo na coivara
Pois bem sabe que o inverno vem agora.
6
A semente ta guardada La no silo
Tem feijão carioca e andu
Feijão ouro, chocha bunda, canapu
E a fava cearense com estilo.
Numa lata tem guardado mais de quilo
Com o milho que Napoleão deixou
Pois em 15 muita gente não plantou
E agora era a vez dela ir pro chão,
A semente que era revolução
E de longe por aqui ela chegou.
7
Dessa forma todo o sítio Marinho
E os demais por aqui pelo Nordeste
Quando ver uma chuva logo investe
A plantar nem que seja um pouquinho.
Ninguém fica olhando para o vizinho
Esperando um cozido de feijão
Todo mundo vai pra roça em prontidão
Sem perder um instante do inverno,
Quando chove nossa mata veste o terno
E o roçado bem viçoso cobre o chão.
8
E assim toda a comunidade
Bem ligeiro plantaram suas roças
Pois não tem teimosias iguais as nossas
Quando ver chovendo com vontade.
Nessa hora a esperança nos invade
Ninguém pensa no sofrer do outro ano
Que deixou o sertão no desengano
Sem chover uma gota pra molhar,
Sofrimento nunca é bom de recordar
É melhor traçar logo um novo plano.
9
Dessa forma toda planta se espalha
E ficaram esperando o resultado
Só não via movimento de Bernardo
Pois o mesmo não moveu nem uma palha.
Sua roça destocada sem ter falha
Tava limpa desde o ano passado
Pois em 15 não tivemos chão molhado
Como era que nascia mato nela,
Só que tinha um segredo dentro dela
E Bernardo esperava o resultado.
10
O segredo era o milho de Bernardo
Daquela semente tão falada
Que no ano de 15 foi plantada
Mas sem chuva não tinha germinado.
E que surpresa quando viram no roçado
Uma planta, no entanto muito nova
Seu Bernardo na palavra é uma prova
Que com chuva o melhor assim se fez,
A semente veio nascer em 16
Sem falhar nem um pé nem uma cova.
-FIM-
RENA BEZERRA
(Baseada nos
causos de Bernardino Araújo- 'o velho' Bernardo.)
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