quinta-feira, 19 de janeiro de 2017

Breve histórico sobre a cultura do algodão em Serra Talhada

Charles Bezerra Cabral
francisco.charles@ipa.br
87-9921.1000


     É com orgulho que publicamos essa matéria sobre a história do algodão em Serra Talhada, tendo em vista as riquezas que essa malvácea produziu no Nordeste e em especial em Serra Talhada nos seus tempos áureos. Sendo motivo inclusive de festas anuais com a presenças de personalidades ilustres por ocasião dessas festas. Ivan Souto de Oliveira Júnior, Pesquisador do IPA, que por mais de três décadas décadas prestou valorosos serviços em prol da cultura do algodão na Estação Experimental Lauro Ramos Bezerra - Serra Talhada, assina essa matéria a qual fazemos o prefácio com muita satisfação. Esperamos que esse escrito possa satisfazer curiosidades e estudiosos sobre esse importante tema. Boa leitura.


Breve histórico sobre a cultura do algodão em Serra Talhada
(Ivan Souto de Oliveira Júnior)

         Serra Talhada, antiga Vila Bela, nasceu como uma fazenda de criação de gado, quando o português Agostinho Nunes de Magalhães lá se estabeleceu com sua família para explorar essa atividade. Devido a posição estratégica dos currais deste português para os caminhos que levavam para a Paraíba, Ceará e Bahia, logo passou a ser um ponto de encontro de peões e vaqueiros que transportavam seus rebanhos para estas localidades, e assim, começa a se formar um aglomerado de feirantes, cujo principal foco era a venda de gado. Assim, inicia-se a criação deste município. Portanto, a principal vocação do Vale do Pajeú, era a pecuária extensiva. Esta região, por está assentada no sertão de Pernambuco, sempre está sujeita a ocorrência de secas episódicas. Como, naquela época, a caatinga ainda estava preservada, a pecuária tinha como principal fonte de suporte forrageiro a exploração deste bioma. Por este período, também se iniciou o cultivo do algodoeiro mocó destinado à produção de fibras para uso nas indústrias têxteis e similares. Trata-se de uma planta da família das malváceas,
de hábito semi-perene , que produz fibras longas (36-38 mm) e de grande resistência a seca . Devido a particularidade de se manter verde, mesmo na ausência de chuvas e de possuir folhas e sementes com elevado teor de proteína bruta, logo passou a constituir um sistema de produção de gado em associação com a caatinga . Após a colheita do algodão, que ocorria nos meses de setembro e outubro, quando a caatinga já não dispunha de biomassa para alimentar o gado, o mesmo era colocado nos roçados de algodão, onde encontravam forragem verde e de elevado teor protéico. Além de manterem-se vivos, chegavam até a ganhar peso. A principal atividade agrícola da região semiárida era representada pelos cultivos do milho, feijão, mamona, algodão e palma forrageira, mas, ressalvando, que existia uma forte interação entre a atividade pecuária e o cultivo do algodão. O cultivo do algodoeiro mocó era praticado em toda região do nordeste, onde atingiu a ordem de 3.000.000 de hectares cultivados. Dada a importância desta cultura para a região, diversas usinas de descaroçamento foram instaladas, para fazer a separação da pluma e da semente. Como a maioria dos agricultores vendia o algodão em caroço, os usineiros ficavam com boa parte desta lucratividade. O algodão mocó produzia 40% de seu peso em fibra e 60% em caroço. Como a semente constitui-se num sub-produto, era neste material que residia o principal lucro do usineiro. Esta atividade tornou-se economicamente viável até os meados da década de setenta, quando começou a enfraquecer e foi extinta nos anos oitenta. Várias foram às causas da decadência da cultura algodoeira no Nordeste brasileiro. Dentre as principais podemos citar as seguintes como as mais expressivas:
1)    Técnicas rudimentares de produção
2)    Formas arcaicas de exploração da terra
3)     Mecanismos viciados de comercialização (atravessador)
4)    Escassa utilização de sementes selecionadas
5)    Adversidades climáticas
6)    Difícil acesso ao crédito rural
7)    Aparecimento do bicudo



Por ter sido o município de Serra Talhada um grande produtor de algodão, além de possuir uma posição geográfica privilegiada, algumas empresas que comercializavam este produto, estabeleceram-se por aqui. Dentre estas, citamos a Sociedade Algodoeira do Nordeste Brasileiro (SANBRA) que adquiria o algodão dos produtores locais e exportava para os centros de processamento. Além da SANBRA, existiam alguns comerciantes compradores de algodão, com destaque para o Coronel Cornélio Soares. Além de todos estes fatores favoráveis a exploração desta cultura, Serra Talhada contava com uma Estação Experimental, conhecida como a Fazenda Saco, cuja principal atividade era a pesquisa com o algodoeiro mocó, sendo, juntamente com as Estações de Veludo na Paraíba e Cruzeta no Rio Grande do Norte, as principais referências do Nordeste no estudo desta planta. As principais contribuições destas Estações para fortalecer a atividade cotonícola regional foi a criação das variedades 9193 (Cruzeta); C71 (Veludo) ; APA, 841 Precoce e 1021 Tardia ( Estação Experimental de Serra Talhada) . Para dá suporte às atividades de pesquisa da Estação de Serra Talhada, foi contratada através de convênio firmado com a SUDENE, uma consultoria francesa Institute de Recherces e du Cotton e Textiles Exótiques (IRCT) , através do qual, dois melhoristas de plantas , Dr. Boulanger e Dr. Trellu , vinham a Serra Talhada pelo menos duas vezes por ano, no sentido de orientar os trabalhos de melhoramento do algodoeiro mocó. A estação chegou a plantar cerca de 800 há com esta planta. Os trabalhos de capina eram executados com trator de pneus e mecanização animal, utilizando mão de obra manual apenas para o coroamento das plantas. A colheita era manual e normalmente se faziam três por safra. Dada a exigência de mão de obra, recorria-se a trabalhadores das circunvizinhanças, cujo quantitativo podia chegar a até 400 trabalhadores. As principais pragas da cultura naquela época eram a broca e o curuquerê. O controle da broca era realizado com pulverizadores manuais, enquanto o do curuquerê era feito  de forma aérea, com a utilização de aviões que vinham de Recife.Toda a produção da Fazenda Saco era processada na Usina localizada na própria Estação, a qual contava com descaroçadores e uma prensa para enfardar a pluma. Os fardos de pluma pesavam cerca de 220 kg cada um e eram destinados ao comércio. A semente era utilizada para plantio e alimentação dos rebanhos do IPA. Dada a importância do algodão para o município de Serra Talhada, o prefeito Moacir Godoy, criou no início dos anos 50 a festa do algodão. O evento era realizado no mês de agosto, pois coincidia com o início da colheita. O mais importante e grandioso foi realizado no ano de 1953 e contou com a presença de inúmeras pessoas ilustres do cenário político e social do Brasil, com destaque para: João Cleophas ( Ministro da Agricultura); Etelvino Lins (Governador de Pernambuco); Assis Chateaubriand (proprietário dos Diários Associados) ; Apolônio Sales (Senador da República), dentre outros . A festa teve até o coroamento de uma rainha, cujo nome era Maria Tereza de Godoy Bené. Encantado com a beleza regional de Maria Tereza, o Dr. Chateaubriand teria lhe dirigido alguns galanteios que não foram muito bem recebidos pelos familiares da moça. Segundo comentários feitos à época, o Dr. Chateaubriand teria saído da festa escondido na mala de um carro, temeroso de uma agressão.

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